Em 21 de julho de 2025, o Projeto de Revisão da norma ABNT NBR 5419 – Proteção contra Descargas Atmosféricas (Partes 1 a 4) foi oficialmente disponibilizado para Consulta Nacional no site da ABNT, https://lnkd.in/dBZdKVJR . Trata-se de um momento decisivo para a engenharia elétrica brasileira: a comunidade técnica, os profissionais atuantes na área, os órgãos reguladores e demais interessados têm agora a oportunidade de contribuir diretamente para a formulação da norma que definirá as diretrizes de segurança nas instalações da PDA no país nos próximos anos.

A Consulta Nacional é um mecanismo formal e democrático da Associação Brasileira de Normas Técnicas, que permite a participação de qualquer cidadão na consolidação das normas técnicas brasileiras. É nessa fas que a minuta do Projeto de Norma é submetida à análise pública, permitindo que sugestões, críticas ou aprovações sejam registradas e avaliadas pela respectiva Comissão de Estudo.
Segundo a ABNT, o participante pode:
- Aprovar o projeto sem ressalvas;
- Aprovar com objeções de forma, tais como correções gramaticais, de clareza ou terminológicas
- Reprovar com objeções técnicas, desde que fundamentadas com base normativa, científica ou prática.
As manifestações precisam seguir um formato adequado, que inclua o trecho do texto a ser alterado, a sugestão de nova redação e a justificativa técnica clara e objetiva. Sugestões vagas, genéricas ou sem proposta de texto substitutivo podem ser desconsideradas.
Se você atua em projeto, instalação, manutenção ou inspeção de Sistemas de Proteção contra Descargas Atmosféricas (SPDA), esta norma influencia diretamente seu trabalho.
A nova NBR 5419 impactará:
- na elaboração de projetos, relatórios técnicos e outros documentos;
- no dimensionamento e a execução de sistemas de captação, descida e aterramento;
- no dimensionamento e na utilização de equipamentos de proteção contra surtos (DPS);
- na aplicação de normas complementares, como NBR 16785 e NBR 5410; entre outros.
Além disso, a Consulta Nacional garante que as normas brasileiras reflitam a realidade do campo e sejam aplicáveis com segurança, clareza e eficácia. Diferente de uma votação comum, a elaboração da ABNT se dá por consenso técnico. Isso significa que uma única objeção tecnicamente bem fundamentada pode ser suficiente para reabrir discussões, ajustar o texto e influenciar diretamente a redação final. Afinal, consenso técnico não é quantidade de pessoas, mas sim robustez técnica.
O que muda na NBR 5419:2025?
A nova proposta da NBR 5419 não é apenas uma atualização pontual. Trata-se de uma profunda revisão técnica que busca simplificar a utilização do documento e incorporar avanços normativos internacionais, especialmente com base na edição 2024 da IEC 62305, ao mesmo tempo que responde a desafios técnicos vivenciados no Brasil ao longo da última década.
A seguir, apresentamos uma visão geral das alterações da norma:
Parte 1 – Princípios Gerais
A nova versão propõe maior clareza conceitual e reorganização de conteúdos fundamentais. Todas as partes receberam uma lista de termos e definições atualizada e robusta.
Entre os destaques:
- Tabela 1 – Tipos de estrutura: agora distingue entre residências simples e robustas, promovendo uma análise mais realista dos riscos e necessidades.
- Perdas consideradas: a classificação foi ajustada para L1 e L3, enquanto L4 passou para anexo informativo, sem obrigatoriedade de utilização, e L2 foi substituída pela categoria F (frequência de dano).
- Riscos: R1 e R3 são mantidos. O R2 foi removido e substituído por F, enquanto o R4 foi movido para anexo informativo.
- Anexo E: agora trata de forma simplificada das correntes de surto em pontos distintos da instalação, considerando menos caminhos para o escoamento da corrente atmosférica. Uma abordagem mais simples e conservadora.
Parte 2 – Análise de Risco
A Parte 2, antes intitulada “Gerenciamento de risco”, agora se chama “Análise de risco”, refletindo uma abordagem mais direta e científica. As mudanças são profundas:
- Definição clara da frequência de dano: item agora definido com base em eventos anuais e probabilidade de ocorrência.
- Anexo E: que antes apresentava exemplos de análise de risco, está atualmente vago, indicando possível abertura para contribuições futuras.
- Atualização de dados de densidade de descargas (Ng): o antigo link do INPE, inativo desde 2022, foi substituído por uma nova base nacional de dados com metodologia rigorosa e transparente.
- Novo Anexo F: apresenta mapas coropléticos do Brasil por região e lista de densidade de raios por município (resolução de 12,5 km). Os dados foram obtidos a partir do sensor LIS do satélite TRMM da NASA e calibrados com a BrasilDAT.
- Foi adicionada uma tabela com a densidade de raios de todos os municípios do Brasil ao texto, dado muito útil na consulta para análise de risco, mas que aumentou significativamente o número de páginas da Parte 2.
Parte 3 – Danos Físicos e Perigos à Vida
Essa parte passa a trazer um refinamento conceitual importante, além de reforçar aspectos de inspeção e segurança:
Terminologia e conceitos
- Substituição do termo “classe de proteção” por “nível de proteção”, evitando dúvidas de aplicação, principalmente na especificação de DPS;
- Reforço na distinção entre SPDA externo/interno, natural/não natural, isolado/não isolado. Captação, descida e aterramento
- Os três métodos de captação continuam válidos (esfera rolante, ângulo de proteção e malha), mas há reforço nas recomendações de aplicação, com a complementação da NBR 16785 para proteção em áreas abertas.
- Padronização das seções dos condutores de aço cobreado com cobre:
- Captação e descida: 35 mm²;
- Aterramento: 50 mm²;
- Possibilidade de utilização de cabos de cobre com 19 fios para SPDA externo (captação, descidas e aterramento).
Tabelas e ensaios
- Tabela 4: novas referências de temperatura (ΔT) e tempo (t50) para efeitos térmicos de surtos comcomponente longa.
- Tabela 6: considera a possibilidade de utilização do condutor de cobre nu dentro do concreto armado.
- Novo Anexo F: requisitos claros para ensaios de continuidade elétrica, incluindo o uso de microhmímetro,terrômetro tipo alicate e multímetros em casos específicos.
Inspeção e documentação
- Nova Seção 7 traz exigência de relatório técnico completo, com diretrizes sobre:
- periodicidade e responsabilidade das inspeções;
- critérios de manutenção;
- arquivamento e organização documental.
Parte 4 – Sistemas Elétricos e Eletrônicos Internos às estruturas
Na Parte 4, as mudanças visam tornar a PDA mais eficaz no contexto da proteção de instalações abordando todos os níveis de proteção:
Zonas de Proteção contra Raios (ZPR)
A norma reforça o papel das ZPR como ferramenta de contenção e segmentação de surtos, integrando o conceito à arquitetura da instalação e à classificação dos equipamentos.
Proteção com DPS:
- A nova Tabela A.1 facilita a escolha de dispositivos de proteção contra surtos com base na suportabilidade dos componentes (Uw), promovendo escolhas mais adequadas em projetos e inspeções.
- Anexo C apresenta um sistema coordenado de DPS, com critérios de distância, classe, sequência e proteção com abordagem objetiva e eficiente.
Inspeção das MPS
- O texto traz reforço à necessidade de ensaios para continuidade elétrica nas ligações equipotenciais, onde inspeções visuais não possam ser realizadas.
- Há também maior detalhamento na documentação das medidas de proteção contra surtos (MPS), incluindo localização dos dispositivos, áreas protegidas e ligações equipotenciais.
Uma Norma Técnica Feita Pela Comunidade Técnica
Todo esse processo de revisão só terá real validade se contar com a contribuição ativa dos profissionais que lidam com a proteção contra descargas atmosféricas no dia a dia. Não se trata apenas de uma exigência burocrática: trata-se de garantir que a norma seja aplicável, exequível e aderente à realidade brasileira, tanto em obras de pequeno porte quanto em grandes instalações industriais ou críticas.
Como elaborar sua contribuição?
Ao acessar o link da Consulta Nacional, você poderá visualizar o texto completo do projeto e enviar sua manifestação por meio da plataforma da ABNT. Lembre-se:
- Seja claro e objetivo;
- Indique o trecho exato a ser alterado;
- Apresente a nova redação proposta;
- Fundamente tecnicamente sua sugestão, seja com base normativa (NBR, IEC, IEEE etc.), evidências científicas ou experiência prática comprovada.
A nova versão da NBR 5419 representa não apenas um avanço técnico, mas também um compromisso coletivo com a segurança das pessoas, a confiabilidade das instalações e a valorização do conhecimento técnico nacional. Como toda norma construída por consenso, sua qualidade final dependerá diretamente da qualidade das contribuições recebidas neste momento.
Por Jobson Modena engenheiro eletricista com 32 Anos de experiência; coordenador da comissão de estudo da ABNT: Proteção contra descargas Atmosféricas; representante brasileiro no TC- 81 da IEC; Membro das comissões de estudo da Abnt (instalações elétricas de baixa tensão e Aterramentos elétricos) em Revista Potencia Ed nº 235.

