Existem registros de grandes acidentes envolvendo a explosão de instalações industriais contendo poeiras combustíveis desde o final do Século 19. Em 1878 ocorreu uma explosão envolvendo um moinho contendo farinha de trigo, em Minneapolis / Minnesota, nos EUA. Este acidente destruiu o maior silo de grãos existente no mundo até então, bem como outros cinco outros moinhos nos arredores, resultando na morte de 22 pessoas. Como decorrência deste acidente os moinhos foram requeridos a instalar melhores sistemas de ventilação, de forma a evitar a formação de nuvens de poeira.
Em 1921 uma explosão em uma mina subterrânea de carvão em Mount Mulligan / Queensland, na Austrália resultou na morte de 75 pessoas. Em 1942 uma explosão em uma mina de carvão em Benxi / Liaoning, na China, causou a morte de 1.549 pessoas, sendo considerado o pior acidente envolvendo poeiras combustíveis do mundo.
Desde a época destes acidentes as normas técnicas sobre atmosferas explosivas têm sido revisadas e atualizadas, de forma a incorporar requisitos para a fabricação de equipamentos que sejam seguros para a instalação em locais contendo poeiras combustíveis, bem como de normas técnicas sobre os procedimentos corretos de seleção, montagem, inspeção, manutenção e reparos de equipamentos “Ex”.
Até o presente momento tais normas técnicas continuam evoluindo, incorporando requisitos para a competências pessoais dos profissionais que executam atividades de classificação de áreas, seleção, montagem, inspeção, manutenção e reparos de equipamentos “Ex”, em atmosferas explosivas de gases inflamáveis e de poeiras combustíveis, bem como de requisitos de certificação de empresas de prestação de serviços destas atividades “Ex”.
A Norma ABNT NBR IEC 60079-31 – Atmosferas explosivas – Parte 31: Proteção de equipamentos contra ignição de poeira por invólucros “t” estabelece os requisitos de projeto, fabricação, ensaios, avaliação e certificação de equipamentos com o tipo de proteção Ex “t”. Esta Norma é aplicável a equipamentos elétricos, de instrumentação, de automação, de telecomunicações e de automação protegidos por invólucros e com limitação de temperatura de superfície para utilização em atmosferas de poeiras combustíveis.
Os tipos mais comuns de equipamentos com tipos de proteção Ex “t” são os seguintes: Motores trifásicos de baixa e de alta tensão, de indução ou síncronos, Luminárias industriais LED lineares e não lineares, Plugues e tomadas industriais, Instrumentos sensores e transmissores, Invólucros para câmeras e “pan-tilt” de circuitos fechados de TV (CFTV), Invólucros para painéis elétricos de distribuição de força, Invólucros para botoeiras de comando locais e caixas de junção, Invólucros para painéis de instrumentação e de automação e Roteadores de Wi-Fi para áreas classificadas de poeiras combustíveis.
Os equipamentos com tipo de proteção Ex “t”, como motores elétricos, botoeiras de comando local, luminárias, caixas de junção, instrumentos e painéis elétricos, devem ser instalados no interior de silos e de armazéns portuários onde exista a presença de farinha de trigo, soja, milho, cevada, café, açúcar, adubo ou fertilizantes. Estes equipamentos para poeiras combustíveis são também instalados em locais onde são instaladas correias transportadoras de grãos, farinha, farelo ou adubo, por exemplo, entre os silos ou armazéns portuários para o interior de navios de carga.
Os equipamentos com proteção Ex “t” se caracterizam por possuir um tipo de proteção para atmosferas com poeiras combustíveis, onde o equipamento possui um invólucro que provê proteção contra ingresso de poeira ao seu interior, bem como possui meios de limitar a temperatura de superfície, que seja inferior à temperatura de ignição da poeira combustível que possa estar presente no local da instalação.
A Norma ABNT NBR IEC 60079-14 (Projeto, seleção e montagem de instalações elétricas em atmosferas explosivas) especifica que tipos de proteção “Ex” podem ser aplicados em cada local de classificação de áreas, em função do nível de proteção de equipamento (EPL) proporcionado por estes equipamentos “Ex”. Aquela Norma indica os requisitos de especificação técnica, seleção, montagem e inspeção inicial detalhada de todos os equipamentos “Ex” para instalação em atmosferas explosivas contendo gases inflamáveis ou poeiras combustíveis, incluindo os equipamentos elétricos, de automação ou de telecomunicações com tipo de proteção Ex “t”.
Limitações de temperatura devidas à presença de nuvens de poeira: Os equipamentos com tipo de proteção Ex “t” devem ser selecionados de forma que sua temperatura máxima de superfície não atinja a temperatura de ignição de qualquer poeira combustível que possa estar presente no ambiente.
A temperatura máxima de superfície do equipamento Ex “t”, de acordo com a ABNT NBR IEC 60079-14, não pode exceder dois terços da temperatura mínima de ignição, em graus Celsius, da mistura poeira com o ar considerada, ou seja, T MAX = 2/3 T NUVEM, onde T NUVEM é a temperatura mínima de ignição da poeira em forma de nuvem.
Limitações de temperatura devido à presença de poeira em forma de camada: Quando o equipamento não é marcado com a espessura da camada de poeira, como parte da marcação de temperatura “T”, um fator de segurança deve ser aplicado, levando em consideração a espessura da camada de poeira, da seguinte forma: Para camadas de poeira combustível até 5 mm de espessura: A temperatura máxima de superfície dos equipamentos, de acordo com a ABNT NBR IEC 60079-14 sem a presença de poeira, não pode exceder o valor de 75 °C abaixo da temperatura mínima de ignição para a espessura de camada de 5 mm da poeira específica T MAX < T 5 mm – 75 ºC, onde T 5 mm é a temperatura mínima de ignição (incandescência) de poeira combustível em forma de camada de 5 mm.
Os métodos e procedimentos para a determinação da temperatura de ignição das poeiras combustíveis é indicado na Norma ABNT NBR ISO/IEC 80079-20-2 – Atmosferas explosivas – Parte 20-2: Características dos materiais – Procedimentos de ensaios de poeiras combustíveis, publicada pela ABNT em 2018.
Com relação ao nível de proteção provido pelo equipamento “Ex”, denominado de EPL(Equipment Protection Level), o tipo de proteção Ex “t” é dividido em três níveis de proteção, com base no risco do equipamento elétrico se tornar uma fonte de ignição em uma atmosfera explosiva de poeira. Equipamentos com proteção contra ignição por poeira Ex “t” podem proporcionar os seguintes níveis de proteção: Nível de proteção “ta” (EPL “Da”), Nível de proteção “tb” (EPL “Db”) e Nível de proteção “tc” (EPL “Dc”).
Os equipamentos com tipo de proteção Ex “t” se caracterizam por possuírem um grau de proteção mínimo IP55 ou IP65, de acordo com a Norma ABNT NBR IEC 60529 (Grau de proteção para invólucro de equipamentos elétricos) ou Norma ABNT NBR IEC 60034-5(Grau de proteção para máquinas elétricas girantes).
Estes graus de proteção indicam que o invólucro do equipamento elétrico Ex “t” possui vedações, gaxetas ou juntas bastante eficientes, fabricadas de tal forma que evitam o ingresso da poeira que possa estar presente no local de instalação para o seu interior, evitando, desta forma, os riscos de ocorrência de baixa isolação ou de correntes de fuga.
Além da característica de elevado grau de proteção, outra característica fundamental dos equipamentos Ex “t” é terem a sua temperatura máxima de superfície determinada por projeto. De forma que os equipamentos Ex “t” não representem uma fonte de ignição para as camadas de poeiras combustíveis que podem se acumular sobre seus invólucros, esta temperatura máxima de superfície deve ser menor do que a temperatura de ignição da poeira combustível que pode estar presente no local da instalação.
O tipo de proteção Ex “t” é um tipo de proteção destinado a ser aplicada em equipamentos que se destinam a instalação em áreas classificadas contendo poeiras combustíveis, dos tipos Zonas 20, 21 ou 22, com a presença de substâncias dos Grupos IIIA, IIIB ou IIIC.
A relação entre nível de proteção do equipamento Ex “t” (EPL), zona de classificação de áreas contendo poeiras combustíveis, grupo de equipamento e grau de proteção (IP) são indicadas na tabela a seguir.
Deve ser ressaltado que outros tipos de proteção “Ex”, tais como os invólucros metálicos à prova de explosão (Ex “d”) e a segurança aumentada (Ex “e”) são destinados a serem aplicados em equipamentos que se destinam a instalação em áreas classificadas contendo gases inflamáveis, dos tipos Zonas 0, 1 ou 2, com a presença de substâncias dos Grupos IIA, IIB ou IIC. Os tipos de proteção para gases inflamáveis se baseiam, por exemplo, nos requisitos de contenção da explosão no interior do invólucro ou do aumento das distâncias de isolamento e de escoamento, de forma a evitar o risco de ocorrência de correntes de fuga e de curtos circuitos.
O tipo de proteção Ex “t”, por sua vez, se baseia nos requisitos de elevado grau de proteção contra o ingresso de poeira para o interior do equipamento elétrico e na determinação da temperatura de superfície, de forma que esta seja inferior à temperatura de ignição da poeira combustível existente no local de sua instalação.
Deve ser ressaltado que os equipamentos “Ex” certificados de acordo com o tipo de proteção por invólucro à prova de explosão (Ex “d”) não são adequados para instalação em áreas classificadas contendo poeiras combustíveis, em função deste tipo de proteção ser aplicável somente para locais contendo gases inflamáveis.
Exemplo de equipamentos invólucro à prova de explosão com a milenar técnica de fundição em areia, que não são adequados para instalação em áreas classificadas contendo poeiras combustíveis (Zona 20, Zona 21 ou Zona 22)
Neste sentido é necessário esclarecer que, em muitos casos, ainda se verifica infelizmente o erro primário de se considerar que os equipamentos vulgarmente chamados de “à prova de explosão” como sendo equipamentos que podem ser instalados em todos os locais contendo áreas classificadas. Este conceito não é correto, uma vez que a aplicação deste antigo tipo de proteção, baseado em invólucros metálicos à prova de explosão é restrito somente para instalação em atmosferas explosivas de gases inflamáveis e não de poeiras combustíveis.
O Documento Operacional IECEx OD 017 – Orientação sobre desenhos e documentação para a certificação IECEx é normalmente utilizado pelos fabricantes, Organismos de Certificação e de Laboratórios de Ensaios de equipamentos “Ex”, para estabelecer os detalhes de documentação e informações mínimas que necessitam ser apresentadas pelos fabricantes nos desenhos e documentos para certificação de equipamentos “Ex”.
Os seguintes detalhes e informações necessitam ser apresentados nos desenhos e documentos do processo de certificação para equipamentos Ex “t”, quando aplicável.
- Desenho do arranjo geral do invólucro e do equipamento.
- Os métodos de vedação e arranjos de montagem de eixos, hastes e foles.
- Informações sobre as partes internas dos equipamentos elétricos, arranjo geral, valores nominais de potência. Nos casos gerais, o arranjo e a dissipação de calor dos componentes internos, mostrando a localização as dimensões aproximadas de cada componente, incluindo distâncias entre componentes e a parede mais próxima. O objetivo é o de controlar a localização das fontes de calor, para fins de classificação de temperatura, para temperatura suportada por partes plásticas, janelas resinadas, outros materiais de enchimento, entrada de cabos, etc., e para a confirmação da temperatura ambiente do equipamento. Quando for pretendido que o certificado inclua variações no conteúdo do invólucro, detalhes suficientes da faixa de variação, de forma que os limites de projeto para cada variação estejam totalmente esclarecidos.
- Com relação às juntas e vedações: detalhes de fabricação, dependendo do EPL pretendido.
- Os espaçamentos entre furos para os dispositivos de fixação. Especificação dos tipos dos dispositivos de fixação.
- Se requerido para juntas e vedações: os tamanhos, tipos, encaixes de roscas, flanges e juntas de encaixe .
- Detalhes das plaquetas de advertência.
- Desenhos que mostrem todos os furos nos invólucros, entradas roscadas e comprimento das roscas.
- Detalhes dos materiais dos invólucros, materiais das janelas, espessuras e das juntas e vedações.
Deve ser ressaltado, no entanto, que o mercado nacional e internacional de equipamentos“Ex” já disponibiliza uma ampla e completa gama de equipamentos, produtos, materiais e sistemas “Ex”, tantos elétricos como mecânicos, com uma certificação de terceira parte, emitida por um Organismo de Certificação de Produtos acreditado, seja pelo INMETRO, no âmbito nacional, seja pelo IECEx – Sistema da IEC para certificação abrangendo o todo o ciclo de vida “Ex”.
Desta forma, pode ser verificado que o sistema de certificação de equipamentos “Ex” se encontra esgotado e saturado, em termos de atender os seus objetivos de elevação dos atuais níveis de segurança e das pessoas que trabalham em instalações contendo atmosferas explosivas.
Tendo como base a grande quantidade de não conformidades de projeto, montagem, inspeção, manutenção e reparo dos equipamentos e instalações elétricas “Ex” que podem ser verificadas em diversas plantas industriais no Brasil, é reconhecido que a simples certificação de equipamentos elétricos “Ex” não é suficiente para garantir a segurança das instalações e pessoas envolvidas em áreas classificadas.
Sob o ponto de vista de segurança industrial pode ser verificado que de pouco adianta que os equipamentos elétricos “Ex” tenham sido certificados de terceira parte, por Organismos de Certificação de Produtos, acreditados, se os mesmos não são devidamente especificados, instalados, inspecionados, mantidos ou reparos, ao longo das décadas em que normalmente permanecem instalados em locais de elevado riscos de explosão, contendo atmosferas explosivas de gases inflamáveis ou de poeiras combustíveis.
Explosão ocorrida em 2008 na Refinaria de Açúcar Imperial Sugar, no Estado da Georgia, nos Estados Unidos, decorrente da existência de camadas de poeira combustível decorrente de falhas nos procedimentos de limpeza
Isto pode ser verificado em função das diversas não conformidades de projeto, montagem, inspeção, manutenção e reparos que são frequentemente verificadas nas instalações em áreas classificadas de diversas indústrias das áreas do petróleo, petroquímica, química, silos de grãos, sucroalcooleira e de alimentos. Tais não conformidades podem invalidar as proteções proporcionadas pelos equipamentos “Ex” certificados e colocar em risco as instalações em atmosferas explosivas nas quais tais equipamentos foram instalados.
Para que estes níveis de segurança possam ser elevados há a necessidade de uma nova postura com relação a este problema, com a adoção de um ponto de vista de certificação que não fique limitado somente à certificação dos equipamentos “Ex”, mas incluindo também a certificação das pessoas e das empresas que realizam serviços em áreas classificadas.
As deficiências e não conformidades que são introduzidas durante a realização das atividades de instalação, manutenção ou reparos, fazem com que os equipamentos “Ex” percam as suas características originais de proteção contra a ignição de atmosferas explosivas que podem estar presentes em seus locais de instalação. Estas deficiências são, na maioria das vezes, decorrentes de falta de treinamentos, conhecimentos, experiências, habilidades, qualificações e certificação das competências das pessoas responsáveis e dos executantes destes tipos de serviços.
Exemplo de silo de armazenamento de coque de petróleo, em galpão contendo esteiras transportadoras e sistemas de carregamento e descarregamento para este tipo de poeira combustível
A abordagem de certificação com base no “ciclo total de vida” das instalações “Ex” reconhece o fato de que somente a “tradicional” certificação de equipamentos “Ex” não é suficiente para garantir a segurança das instalações em atmosferas explosivas e nem das pessoas que nelas trabalham.
Sob o ponto de vista do ciclo total de vida das instalações elétricas em atmosferas explosivas, os equipamentos elétricos “Ex” necessitam estar seguros durante todo o tempo em que permanecem instalados em áreas classificadas, ao longo de décadas, e não somente quando estes equipamentos saem das fábricas.
Neste sentido, existe a necessidade básica de certificação também das competências das pessoas que realizam atividades em áreas classificadas bem como das empresas de prestação de serviços, tais como empresas projetistas, de montagem, de inspeção, de manutenção e oficinas de serviços de reparo, revisão e recuperação de equipamentos “Ex”.
Muito mais do que na simples certificação de equipamentos “Ex”, é na certificação prioritária das empresas de serviços “Ex” e na certificação prioritária das competências pessoais “Ex” das pessoas envolvidas com as diversas atividades envolvendo equipamentos e instalações “Ex”, que reside grande parte da segurança e da conformidade das instalações industriais que processam substâncias inflamáveis e poeiras combustíveis, tal como a indústria do petróleo, petroquímica, química, silos de grãos, farelos, adubo e fertilizantes, farmacêutica, de alimentos e sucroalcooleira.