Novos requisitos sobre equipamentos intrinsecamente seguros para atmosferas explosivas

O conceito de segurança intrínseca tem como base a limitação de energia em equipamentos, componentes e circuitos, de forma a não ser possível a geração de centelhas ou de altas temperaturas que sejam capazes de causar a explosão de uma atmosfera explosiva de gases inflamáveis ou poeiras combustíveis

Foi publicada em 13/01/2023 a sétima edição da Norma Internacional IEC 60079-11Explosive atmospheres – Part 11: Equipment protection by intrinsic safety “i” (Atmosferas explosivas – Parte 11: Proteção de equipamentos por segurança intrínseca – Ex “i”).

Este tipo de proteção Ex “i” é aplicável a equipamentos elétricos e eletrônicos cujos circuitos são incapazes, por eles próprios, de causar a ignição de uma atmosfera explosiva que os envolve. A proteção por segurança intrínseca tem como base a limitação dos níveis e energia de um equipamento ou circuito de forma a não ser capaz a geração de uma centelha ou ponto de alta temperatura que possa provocar a ignição de uma atmosfera explosiva composta por gases inflamáveis ou poeiras combustíveis que possam estar presentes no local da instalação.

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Folha de rosto da sétima edição da Norma Internacional IEC 60079-11: Atmosferas explosivas – Parte 11: Proteção de equipamentos por segurança intrínseca – Ex “i”

A proteção de equipamentos e circuitos por “segurança intrínseca” tem, por objetivo fundamental, que seja evitada a possibilidade de ocorrência de uma ignição em áreas classificadas contendo atmosferas explosivas. Este conceito de segurança por meio da limitação dos níveis de energia com a ocorrência de centelhamento ou de geração de pontos de alta temperatura reconhecidamente representa uma abordagem mais segura do que uma “provável” ou “eventual” contenção da energia proveniente de uma explosão, como previsto em outros tipos de proteção “Ex”.


Dentre as diversas mudanças técnicas mais significativas desta Edição 7.0 (2023) em relação à Edição 6.0 anterior (2011) podem ser destacadas as seguintes:

  • A tensão e a corrente máximas em regime permanente apresentam um risco de ignição por centelha diferente de um transiente. Um transiente é onde qualquer uma destas características (tensão ou corrente) é excedida. Portanto, estados estacionários e transientes necessitam ser considerados separadamente. O Anexo sobre os efeitos “transitórios” foi revisado
  • Quando as distâncias de separação “reduzidas” dependam de um invólucro que proporcione proteção contra o ingresso de água e poeira IP54, e prensa-cabos, adaptadores de rosca ou elementos de vedação (bujões) sejam necessários para completar o invólucro, de forma a manter o grau de proteção (Código IP), estes componentes ou equipamentos necessitam estar de acordo também com os requisitos da Norma ABNT NBR IEC 60079-0 (Requisitos gerais para equipamentos “Ex”)
  • Um requisito de inspeção de rotina foi adicionado para peças encapsuladas, para assegurar que a aplicação do composto de encapsulamento seja aceitável durante a fabricação
  • Os requisitos de Temperatura de Operação Contínua (COT – Continuous Operating Temperature) representam uma modificação daqueles especificados na Norma ABNT NBR IEC 60079-0. Quando temperaturas superiores à COT são possíveis, não deve haver danos “internos ou externos”, enquanto na Edição 6 (anterior) da IEC 60079-11/2011, o requisito era que não houvesse nenhum dano “visível”
  • Os fusíveis conectados à rede de alimentação podem ter uma capacidade de interrupção inferior a 1 500 A. No entanto, é necessário que os usuários finais e os instaladores sejam informados quando este for o caso e, portanto, é obrigatório incluir o valor da corrente máxima de interrupção esperada ou presumida, nas instruções do fabricante para os usuários
  • Foram adicionados requisitos para “supercapacitores
  • Foram modificados os requisitos sobre vazamento de eletrólitos, ensaios de temperatura de superfície e ensaios sob camada de poeira, para acumuladores, baterias e supercapacitores, aumentando o número de amostras ensaiadas, e definindo a temperatura na qual os ensaios são realizados
  • Foram alterados os ensaios de rotina para transformadores com enrolamentos primário e secundário em um circuito intrinsecamente seguro

Deve ser ressaltado que em 2013 foi completado o primeiro centenário da criação e do desenvolvimento do “conceito” deste tipo de proteção Ex “i”, decorrente dos estudos e pesquisas decorrentes da explosão de grisu e de poeira de carvão, em uma mina subterrânea, na cidade de Senghenydd, no Reino Unido, em 14/10/1913, na qual morreram 439 trabalhadores, entre adultos e crianças que trabalhavam no local. O conceito de segurança intrínseca é mais antigo do que geralmente pode ser imaginado, sendo que as primeiras certificações ocorreram em 1917, decorrentes destes estudos e pesquisas.

As pesquisas que foram iniciadas na década de 1910 demonstraram que circuitos elétricos podem ser considerados seguros, quando instalados em locais contendo atmosferas explosivas, desde que com devidos parâmetros de limitação de tensão, corrente, capacitância e indutância. Em condições especificadas, um circuito pode ser considerado “intrinsecamente seguro”, sendo incapaz de gerar uma centelha capaz de provocar a ignição de uma determinada atmosfera explosiva ao seu redor. Nascia então há mais de cem anos, o conceito da “segurança intrínseca”, cuja tecnologia de equipamentos se encontra em processo de grande desenvolvimento.

Um sistema intrinsecamente seguro pode ser definido como aquele que é incapaz de liberar energia, seja na forma elétrica ou térmica, suficiente para provocar a ignição de determinada mistura explosiva que possa estar presente no local. A impossibilidade de ignição deve ser mantida e garantida mesmo em caso de ocorrência de falha ou falhas do sistema.

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Representação simplificada de um circuito intrinsecamente seguro, composto por instrumento intrinsecamente seguro, instalado em áreas classificadas contendo gases inflamáveis ou poeiras combustíveis, barreira de segurança intrínseca e sistema digital de controle, representado por DCS ou PLC

A barreira de segurança intrínseca [Ex “i”], inserida no circuito intrinsecamente seguro como equipamento associado [Ex “i”], tem por função básica a limitação da energia que pode ser armazenada na parte do circuito de campo, instalado na área classificada, constituído pelo instrumento de campo Ex “i” e pela fiação de interligação entre estes dois equipamentos.

A máxima energia que pode ser liberada sem comprometer a segurança depende das características da atmosfera explosiva considerada, o que é levado em consideração pelas Normas e pelo processo de certificação de equipamentos Ex “i” e associados.

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Exemplo de instalação de equipamentos medidores e de painel local de medição e controle, com proteção por segurança intrínseca, adequado para instalação em áreas classificadas Zona 1 (Ex ib IIC Gb) e Zona 21 (Ex ib IIIC Db)

O tipo de proteção “i” proporciona facilidades de serviços de manutenção durante o período de operação da planta permitem que procedimentos convencionais de instrumentação sejam utilizados, sem a necessidade de desligamentos de circuitos ou das necessidades de aplicação de complexos procedimentos de liberação de trabalho baseados em áreas classificadas para as quais tenha sido verificado que estejam livres de atmosferas explosivas formadas por gases inflamáveis ou poeiras combustíveis no período de execução dos serviços de campo “Ex”.

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Exemplo de painel contendo barreiras de segurança intrínseca ([Ex “i”]), com isolação galvânica entre os sinais de campo em áreas classificadas e sinais de interface com sistema de controle, integradas no mesmo armário contendo a CPU e pontos de I/O do DCS (Digital Control System)

O tipo de proteção por segurança intrínseca proporciona um dos mais elevados níveis de segurança para instalações em áreas classificadas contendo atmosferas explosivas. De forma consistente e defensável, este tipo de proteção Ex “i” pode ser considerado como sendo um dos mais seguros e o menos propenso a erros ou falhas humanas, quando comparado com os outros tipos de proteção “Ex”.

O tipo de proteção Ex “i” é internacionalmente aceito, existindo ainda uma aceitação progressiva de certificados de conformidade “Ex” emitidos no âmbito internacional, o que faz com que este tipo de proteção seja cada vez difundido e aplicado nos recentes projetos e empreendimentos das indústrias das áreas químicas e petroquímicas, entre outras.

Uma das características mais importantes da utilização do tipo de proteção por segurança intrínseca reside no fato desta proporcionar uma adequada solução para uma grande quantidade de problemas relacionados com atmosferas explosivas, para equipamentos que requeiram baixa energia. Além disto, o tipo de proteção Ex “i” é o único que atende a este critério de possibilitar a instalação de sistemas baseados em baixos níveis de energia em qualquer tipo de zona ou de grupo de área classificada, seja de gases ou poeiras.

Os principais fatores nos quais se baseiam as vantagens da aplicação do tipo de proteção por segurança intrínseca em atmosferas explosivas são os seguintes:

  • O mesmo equipamento intrinsecamente seguro normalmente satisfaz tanto os requisitos para gases inflamáveis como para poeiras combustíveis.
  • A aplicação criteriosa das três categorias de proteção da segurança intrínseca (“ia”, “ib” e “ic”) assegura que sejam utilizados os equipamentos adequados para cada nível de risco. Neste caso, normalmente “ia” é aplicado em Zona 0 ou 20, “ib” é aplicado em Zona 1 ou 21 e “ic” é aplicado em Zona 2 ou 22, a menos que um estudo de risco adicional tiver definido um EPL (Equipment Protection Level) específico para as características de um projeto em particular.
  • Pela sua simplicidade de instalação e manutenção, esta técnica de proteção contribui para diminuição da possibilidade de introdução de falhas de instalação que podem gerar riscos na instalação, pelo pessoal envolvido em serviços de montagemmanutenção e inspeções “Ex”.

Estes fatos, combinados com sua utilização flexível, utilizando equipamentos convencionais de mercado e a sua capacidade de trabalho a quente tende a tornar a proteção Ex “i” como a opção básica para sistemas industriais de instrumentação e automação em atmosferas explosivas para as indústrias do setor químico, petroquímico, de óleo e gás, farmacêutico, alcooleiro e de alimentos, entre outros.

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Exemplo de instalação de barreiras de segurança intrínseca com isolação galvânica com tipos de proteção “Ex”, fonte de alimentação e gateway Ex “de”, em área classificada, com comunicação com DCS por meio de cabos de fibra óptica

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Exemplo de instalação de instrumentos intrinsecamente seguros (Ex “i”), caixa de junção do tipo segurança aumentada (Ex “e”) e cabos dos circuitos de interconexão, montadas em área não classificada

No presente momento, com o inoxerável desenvolvimento exponencial da tecnologia, a segurança intrínseca tem ganhado cada vez mais aplicações, como por exemplo em sistemas de comunicação wireless, robótica, smartphones, tablets, câmeras termográficas, RFID, instrumentação industrial, dispositivos portáteis e pessoais e wearables.

Como uma adequada “extensão” da aplicação do conceito da “segurança intrínseca” são disponíveis também no mercado os equipamentos, dispositivos switches de campo que integram redes de comunicação Ethernet a DOIS fios intrinsecamente segura (2-WISE – Two-Wire Intrinsically Safe Ethernet), de acordo com a ABNT IEC TS 60079-47.

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A revolução Ex “i” anunciada: Sistemas Ethernet intrinsecamente segura a DOIS fios (2-WISE) em áreas classificadas do chão de fábrica da indústria de processo

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Exemplo de aplicação de sistemas com padrão Ethernet APL, com circuitos em Ethernet a dois fios, intrinsecamente seguros (2-WISE), utilizados em atmosferas explosivas. Switch de Campo 2-WISE (Field Switch) conectado a um instrumento transmissor de campo 2-WISE, por meio de circuitos de derivação (spurs)

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Exemplo de aplicação de um Switch 2-WISE instalado em área classificada, conectado a diversos instrumentos de campo sensores, transmissores ou atuadores 2-WISE

A Comissão de Estudo CE 003:031.004 (Segurança intrínseca) do Subcomitê SCB 003:031 (Atmosferas explosivas) da ABNT/CB-003 (Eletricidade), responsável pela elaboração e adoção da respectiva Norma Técnica Brasileira adotada ABNT NBR IEC 60079-11, acompanhou, em nome do Brazil National Committee of the IEC, todo o processo de elaboração, comentários, atualização, votação, aprovação e publicação desta Norma internacional IEC 60079-11 Ed. 7.0.

Mesmo antes da publicação da IEC 60079-11 Ed. 7.0, em 01/2023, foram iniciados pela Comissão de Estudo CE 003.031.004, em 10/2022, os devidos trabalhos de atualização da respectiva Norma Técnica Brasileira adotada ABNT NBR IEC 60079-11, com base no respectivo documento FDIS (Final Draft for International Standard), incorporando as alterações apresentadas nesta nova edição desta norma internacional.

Mais informações sobre a Norma Técnica internacional IEC 60079-11 Edição 7.0 estão disponíveis na IEC Webstore: https://webstore.iec.ch/publication/60654

Roberval Bulgarelli

Consultor sobre equipamentos e instalações em atmosferas explosivas

Organizador do Livro “O ciclo total de vida dos equipamentos e instalações em atmosferas explosivas”

Membro de Comissões de Estudo do Subcomitê SCB 003:031 (Atmosferas explosivas) da ABNT/CB-003 (Eletricidade)

Membro de Grupos de Trabalho do TC 31 (Equipamentos para atmosferas explosivas) e do IECEx (Sistema internacional de certificação “Ex”) da IEC.

https://www.linkedin.com/posts/roberval-bulgarelli_atmosferasexplosivas-areasclassificadas-iec60079-activity-7025220906280960000-NGLJ?utm_source=share&utm_medium=member_android